quarta-feira, 16 de março de 2016

TÃO BOBINHO ESSE MENINO

             Para Henrique tudo era novidade. Isso aconteceu há muito tempo atrás, quando a maioria das conexões com a internet eram discadas. Eram lentas e terríveis, mas o som da placa Fax modem havia cativado os ouvidos atenciosos do rapaz que, para se conectar um pouco com o cyberspace, precisava esperar pelo fim do expediente.
             Seu chefe não se incomodava, pelo contrário, às vezes o constrangia vendo suas conversas por cima de seu ombro com algumas risadas esporádicas e comentários aleatórios. Aquilo incomodava Henrique, mas, aquele universo era por demais fantástico para deixar algo como aquilo o incomodá-lo a ponto de desconectar.
             – Você já pensou em ser psicólogo, Henrique? – Perguntou seu chefe certa vez. – Você leva jeito conversando com as pessoas.
Ele apenas acenou com a cabeça, sem dar muita atenção, agora estava conversando com uma garota que aparentemente parecia bem interessante e que, aparentemente havia gostado dele da mesma forma. Seu chefe ficou excitado com aquela pessoa também e a cada frase trocada ele se aproximava cada vez mais, Henrique começava a sentir aquele bafo quente em seu cangote. Algo que o incomodava, mas por causa da hierarquia e pelo fato de estar na empresa, depois do expediente e ainda navegando na internet...
Por sorte, seu chefe acabou indo até a cozinha e, inesperadamente a garota com que conversava disse que tinha que ir embora, o que deixou Henrique ligeiramente chateado.
– Ah, que pena... – Confessou Henrique. – A conversa estava tão bacana...
Tb achei. – teclou a garota de onde quer que ela estivesse. – Mas está ficando tarde e tenho que ir, mas... – Henrique olhou pela primeira vez no relógio do computador e assustou-se com as horas. Não tinha nem notado que a garota ainda lhe respondia. – Então... Tá afim de continuar conversando? Um pouco só tá... Toma cerveja? Me encontra em tal barzinho na estação Armênia. Até lá.
Quando Henrique voltou os olhos para a tela, já era tarde, ela já havia saído da sala. O que ele fez logo nos próximos segundos. Desligou o computador, se despediu de seu chefe que o olhara sem saber o que estava acontecendo e logo, Henrique estava pegando o metro para seu primeiro encontro via internet. Como era o primeiro, nem pensava na possibilidade das coisas não serem como imaginava, tudo que sentia era aquele rufar de tambores no peito.
Conseguiu chegar ao bar depois de meia hora e, depois de uma ligeira olhada, avistou a garota da internet sentada em uma das mesas. Não tinha como errar, por ser plena segunda-feira, o bar estava completamente deserto, a não ser por ela. Henrique entrou, se apresentou e esperou o convite para se sentar, o que ela fez logo após dar uma olhada atenta para ele.
– Obrigado pelo convite. – Disse Henrique para quebrar o silêncio, ambos se olhavam, ambos haviam curtido o que viram. – Espero não ter demorado tanto para chegar... Trabalho um pouco longe daqui.
– Sem problemas. – Respondeu a garota de cabelos e olhos negros. – Mas não poderei demorar muito, ou seja, duas cervejas no máximo, tudo bem?
Henrique concordou, não havia muito para ser dito naquele momento, ou estava realmente com pressa ou usara apenas um subterfugio para sair de fininho. Mas, decidiu não se importar com isso e continuou na dele. Na quarta cerveja, a conversa estava bem animada, então a garota olhou para o relógio e se levantou, alarmada.
– Meu Deus... Perdi noção do tempo... Preciso ir.
Henrique pagou a conta e juntos saíram do barzinho. Era uma noite bem agradável.
– Obrigado mais uma vez pelo convite. – Disse, Henrique evitando olhar para a garota. – Foi um ótimo bate papo.
– Sim... – Concordou a garota para a surpresa do rapaz. – Você foi uma ótima compan... – Ela se interrompeu, mas logo continuou. – Olha, não costumo fazer isso, mas, quer ir pra casa? – Henrique arregalou os olhos. – Não pense besteira. É só para conversarmos mais... Gostei realmente de conversar contigo...
– Tem algum sofá por lá? – Perguntou Henrique querendo deixar claro sua decisão. Ela assentiu. – Então eu topo.
– Que legal. – Festejou a garota. – Mas não é pra fazer nada tá... Só para conversar. – Enfatizou. E Henrique como era um homem respeitador, anotou em sua mente aquela observação.
Foram conversando no caminho inteiro. Não pararam por nenhum momento. Henrique não sabia onde estava se metendo, mas, talvez da mesma maneira que a garota, ele simplesmente acabou confiando. Depois de muitos semáforos, minutos, risadas e alguns olhares nos olhos esporádicos, eis que chegam ao condomínio que a garota morava. Na conversa, Henrique acabou sabendo que ela tinha um filho, que morava sozinha e essas coisas.
Ao chegar à casa da garota, comeram uma pizza, Henrique conheceu alguns parentes que moravam próximos e que trouxeram a filha da garota. Ela já estava dormindo e Henrique e a garota ficaram a vontade na sala. Conversavam sobre informática, sobre as ferramentas da Microsoft, programação e sobre designers.
Depois de terem visto tudo que podiam no computador, sentaram-se no sofá e a garota acabou deitando a cabeça no colo de Henrique. Era para ser algo inocente, isto é, se a garota não estivesse colocado a cabeça sobre quem não podia. Henrique se empertigou em seu lugar assim que sentiu o adormecido despertando. Puta merda... pensou ele, ­se ela sentir isso o que vai pensar de mim? Vai começar a gritar: tarado, tarado e ai estarei perdido de verdade...
Com receio da reação da garota, Henrique conseguiu se distanciar e, com uma cara de sono, a garota ergueu-se do sofá e olhou para o rapaz.
 – Acho que vou me deitar. – Ela levantou-se, espreguiçou-se na frente do aliviado rapaz. – Bom, boa noite pra você. Vou trazer algumas cobertas.
Henrique respirou aliviado e foi se arrumando no sofá que tinha mais ripas do que almofadas. A garota retornou de pijama, estava bem mais a vontade com o seu pijama. Ela parou abraçada nos cobertores e olhou por alguns instantes para Henrique, estava pensando em algo.
– Não posso deixa-lo dormir nesse sofá horrível. – Ela virou-se de costas e continuou. – Você vai dormir na cama comigo, mas... – ela se virou e com um dedo em riste seguiu com o sermão. – Vai dormir no outro canto da cama, entendeu?
Henrique assentiu. Ele não estava com interesse nenhum, apesar da acordada inesperada no sofá, até aquele momento não havia pensado em nada. Ele queria respeitá-la, ganhar a confiança, ser alguém diferente, enfim... Mentalmente agradeceu pelo convite, o sofá realmente era muito ruim.
Ele se deitou de calça e tudo, justamente para não correr risco algum e ainda, para garantir, meteu a testa e a ponta dos pés na parede. Desejou boa noite para a garota e ali ficaram por alguns minutos em silêncio. Subitamente, a garota quebra o silêncio.
– Nossa! Como essa cama está gelada...
Isso para qualquer outra pessoa seria o gatilho para se virar no sentido da garota, toma-la nos braços e beijá-la com volúpia e ardor intencional para se levar para a cama, mas na cama já estavam, ou seja, era só virar e pronto, mas... Henrique não era qualquer pessoa e a garota quase havia o feito jurar que não faria nada, foi então que ele respondeu.
– Tá mesmo né... Acho que vou voltar para o sofá. 
Depois desta resposta de Henrique, o quarto mergulhou no silêncio e como já era alta madrugada, ambos acabaram adormecendo. Na manhã seguinte, acordaram atrasados, a garota estava correndo para um lado para o outro e Henrique acabou tomando um banho por lá mesmo. Tomaram café e depois de explicar para ele como ir embora, a garota sem mais nem menos lhe tascou um beijo na boca.
E foi nesse momento que a ficha de Henrique caiu, mas era tarde demais. Falaram de tudo no dia anterior só esqueceram-se de trocar e-mails.

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